ONDE ESTÃO OS JOVENS?
Frei José Alves de
Melo Neto, OSJ
“A cultura de massa dá forma à promoção dos valores
juvenis e assimila uma parte das experiências adolescentes. Sua máxima é “sejam
belos, sejam amorosos, sejam jovens”. Historicamente, ele acelera o vir-a-ser,
ele mesmo acelerado de uma civilização. Sociologicamente, ela contribui para o
rejuvenescimento da sociedade. Antropologicamente, ela prolonga a infância e a
juventude junto ao adulto. Metafísicamente, ela é um protesto ilimitado contra
o mal irremediável da velhice.” (Edgar Morin)
Diante de tantos desafios, convites,
atividades que propomos e com a constatação do esvaziamento de nossos grupos
aos jovens, além das inúmeras respostas negativas que recebemos, constantemente
nos perguntamos: Onde estão os jovens? Ou ainda: o que precisamos fazer para compreender
as novas juventudes? Essas são questões que em certos momentos podem nos
provocar certo desânimo.
Ao se fazer essas interrogações e,
em seguida, buscar soluções a partir de reflexão e com planejamento, já seria
uma boa dica para onde deveríamos concentrar nossos esforços.
Porém, isso não é tão simples como
nos parece, haja visto que esses lugares, mudam constantemente, assim como
mudam também as preferências juvenis. No entender do sociólogo Bauman (2001), a
atualidade é um tempo marcado pela flexibilidade,
fluidez e maleabilidade que provocam a fragilização das relações. Além disso,
esse processo de liquefação leva a dissolução das instituições – família,
estado, relações de trabalho, escola, etc – que na modernidade eram
consideradas bases para unificação entre as pessoas. A consequência disso é o surgimento acelerado
de transformações sociais, nas quais se dissolvem os laços afetivos que, por
sua vez, leva a um processo de individuação e subjetividade. E disso os jovens
não são isentos!
O
que muitas vezes dificulta a nossa ação pastoral é a fato que “procuramos” os
jovens da mesma forma que anos atrás, esquecendo, portanto que os mesmo são as
primeiras “vítimas” e, ao mesmo tempo, protagonistas dessa sociedade líquida.
Outro
ponto que devemos levar em conta em nosso trabalho pastoral é a realidade de
“nomadismo”. Esse é um dos elementos que sobressaem na caracterização do perfil
das juventudes na contemporaneidade, ou seja, a sua condição de mobilidade.
Essa palavra pode ser entendida em seu sentido literal (deslocamento espacial e
geográfico ou mesmo “des-centramento, des-espacialização), como também o
significado se amplia a uma mobilidade temporal (viver tempos de passagem,
alternância momentânea, simultaneidades) ou ainda, supor a existência de um
nomadismo de percepção (absorver fluxos, filtrar, aparar, assimilar, equacionar
ou inúmeros “chocs” (Benjamin, 1989, pp 109-113). Todos esses fatores resultam
de uma vida cotidiana tensa e intensa, permeada pela relação com a cidade e
conectada com as velhas e novas mídias.
É
interessante observar que os jovens inseridos em outros lugares, que não nas
grande cidades, também experimentam essa mobilidade temporal e espacial,
propiciada, por exemplo, pelo contato com a televisão ou internet. A imersão no
contexto das variadas mídias permite que o distante se torne próximo e seja
incluído em seu cotidiano doméstico e familiar. A informação passa ser
apropriada quase em tempo real, fazendo com que haja entrelaçamento de papéis e
funções entre os produtores e usuários, os quais vivenciam de forma permanente
os ambientes de migração digital (Vilches, 2003)
Com
tudo isso, podemos constatar que encontraremos os jovens nas mais diversas MÍDIAS SOCIAIS. O grande problema é que
não desenvolvemos uma linguagem apropriada para lidar com esses novos ambientes
e, por isso, temos imensas dificuldades em adentrar no espaço e na vida dos
jovens.
Lugares onde podemos encontrar/educar os jovens?
Não podemos descartar nossos grupos – embora muitos com
estruturas e pensamentos arcaicos – como espaços autênticos de educação e
presença edificante das juventudes. São ambientes privilegiados para acompanhar,
orientar e trabalhar com os jovens. No entanto, os grupos não devem e não podem
constituir-se em lugares aparte, ou seja, retirando dos outros espaços. Antes é
função dos grupos oferecer um duplo movimento de distanciamento e de inserção
das juventudes no mundo e na sociedade. No momento em que estão sob a influência
direta da pastoral, os jovens podem afastar-se de outros espaços de vida para
submetê-los a uma reflexão crítica à luz da fé (distância). E depois ao
voltarem aos seus cotidianos poderão encarar os problemas e alegrias da vida com
um novo ânimo e nova clareza (inserção).
Dentro
de vários espaços que poderíamos citar, quero destacar três (além das mídias
sociais):
1.
Família: A família exerce influência
benéfica e maléfica, oscila entre os extremos de um desastre total e um paraíso
terrestre. Misturam-se doses diferenciadas de elementos construtores da
personalidade do jovem e fatores patogênicos. Essass medida que diferencia as
famílias permitem juízos mais positivos ou negativos. (Libânio, 2004).
Os nossos trabalhos pastorais esbarram fortemente nessa problemática.
Nos grupos de jovens e nas orientações pessoais, debatem-se frequentemente tais
dificuldades, uma vez que a situação familiar ultrapassa o nível pessoal e
interpessoal. Constitui-se aqui uma questão cultural que envolvem os laços
familiares.
2.
Escola-Trabalho: Queremos
encontrar jovens? É só irmos à escola, afinal de contas, os jovens estudam! E
nesse sentido, existem duas forças que exercem poder de coerção junto às
juventudes: o trabalho e o estudo. Esses
dois compromissos conseguem arrancar os jovens da comodidade de suas camas,
fazê-los enfrentar frio ou calor, coloca-los em trânsitos horríveis e
impor-lhes cansaços acumulados. Impressiona
ver os jovens se movimentando em busca de trabalho e de estudo.
As nossas estruturas eclesiais que até pouco tempo conseguiam
movimentar os juventudes tanto quanto as estruturas citadas e, assim exerciam
seu poder coercitivo. Com a aparente liberdade que os jovens adquiriram na
atualidade, a religião buscou atrair essa parcela da sociedade por outros
meios. Infelizmente não são propostas motivadoras e, por vezes, distantes das
realidades juvenis.
Por isso, é inegável a força coativa da escola. Ela exercer
um controle social pela obrigação da frequência. Liga o êxito com a presença
física. Por exemplo: existe a figura da reprovação por ausência, mesmo que o
aluno demonstre ter apreendido até melhor que os colegas que frequentam
assiduamente às aulas. Tal lógica não visa a garantia do aprendizado, já que
este poderia ser assegurado de outra maneira. Muitos analistas suspeitam de uma
vontade social de manter os jovens alheios à vida adulta e sob a guarda
vigilante de adultos. Sendo assim, não podemos descartar de forma nenhuma a
escola como um espeço privilegiado de jovens.
3.
Diversos grupos ou tribos juvenis (urbanas): Estamos
acostumados a ver jovens “normais” em nossas comunidades e/ou cidades. O máximo
do diferente é alguém com um corte de cabelo não comum, ou com uma calça jeans
toda rasgada, ou ainda, jovens com roupa de cor exótica e cheios de correntes,
pulseiras, botons, anéis etc. Isso não parece preocupar. No máximo, causa
espanto ou é motivo de gozação. Nos grandes centros urbanos (e o mundo se
urbaniza cada vez mais), o diferente já se organiza, tem normas, leis, códigos,
adeptos... Este fenômeno da juventude moderna já chegou até nós. É importante
que conheçamos as razões de tal fenômeno para sabermos agir diante dele. E o
nosso agir é pensar seriamente como se aproximar, aproximando-se cativar, e
depois acolher esses jovens, dentro de nossa estrutura muitas vezes moralista e
engessada.
Portanto, precisamos pensar seriamente como tornar a nossa
pastoral mais eficaz no ponto de vista de atingir os jovens a partir de sua
realidade e não cair na tentação de achar que temos que trazer os jovens para
dentro dos nossos “muros”. Só poderemos avançar pastoralmente quando
verdadeiramente aceitarmos que a nossa pastoral é extra-eclesia, portanto, fora dos muros da Igreja, e reconhecendo
os lugares onde a juventude está, como lugares autênticos de Evangelização,
afinal Jesus passava por todos os lugares e onde ele passava “Ele fazia bem
todas as coisas” (Mc 7,37).
Referências Bibliográficas
BENJAMIN, Walter. Walter
Benjamin: Obras escolhidas I: magia e técnica, arte e politica. São Paulo:
Brasiliense, 1985.
BORELLI, S. H. S.; ROCHA, R. M.; OLIVEIRA, R. C. A.; Jovens na Cena Metropolitana: Percepções,
narrativas e modos de comunicação. São Paulo: Paulinas, 2009.
LIBÂNIO, J.B., Jovens em
tempo de pós-modernidade: considerações socioculturais e pastorais. São
Paulo: Loyola, 2004.
VILCHES, Lorenzo. Migração
digital. São Paulo: Loyola, 2003
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